O CONCÍLIO LIDERADO POR TIAGO

O CONCÍLIO LIDERADO POR TIAGO
 
Durante muito tempo tem-se aceitado que Tiago indiscutivelmente foi quem liderou o primeiro Concílio da história da Igreja Cristã, registrado em Atos, no capítulo 15. Porém, atualmente os apologistas católicos têm sustentado a hipótese de que tenha sido Pedro quem liderou tal Concílio. Não escrevo na esperança de convencê-los do contrário, pois sei que essa esperança é vã. Como confessou um monge do Mosteiro de São Bento, em São Paulo:
 
Temos que nos submeter às determinações da Santa Igreja. Embora nossa razão rejeite algum dogma, nossa submissão deve ser incondicional. Se isto é branco e a Santa Igreja diz que é preto, devo-lhe acatar a decisão e renunciar à lógica
 
Ou seja, tentar argumentar logicamente ou através das Santas Escrituras para alguém que idolatra a própria instituição religiosa que segue e faz dela a sua própria “verdade”, é totalmente inútil, é perda de tempo. O meu objetivo em escrever o presente artigo não é visando os fanáticos religiosos de Roma, mas o leitor sincero, honesto e, acima de tudo, com a mente e o coração abertos à verdade.
 
O assunto em questão é breve e não visa nem de longe chegar a explanar o assunto da suposta “primazia” de Pedro por completo. Para este fim escrevi aqui no site um repertório de 205 Provas contra o Primado de Pedro, além de um artigo sobre a missão secreta de Pedro, outro que responde se Pedro era o Chefe dos Apóstolos(?) e mais um que mostra historicamente que Pedro nunca foi Bispo de Roma, além de um livro que está em andamento sobre o tema e que irá abordar o assunto extensivamente.
 
O presente artigo, porém, se resume simplesmente a um único capítulo bíblico e dentro de não mais que trinta versículos. A questão a ser respondida é uma só e se resume a isso:
 
-Quem é que deteve o papel de proeminência no Concílio de Jerusalém?
 
Creio que para analisarmos a questão corretamente e respondermos satisfatoriamente, devemos, antes de qualquer coisa, estabelecer alguns critérios pelos quais podemos sustentar que alguém exerceu primazia em determinado assunto ou situação. Sem estabelecermos critérios, ficará apenas a nossa palavra contra a deles, e não estaremos sendo melhores que nossos oponentes. Portanto, devemos responder as seguintes questões que destacam um líder:
 
-Quem foi que teve a palavra final?
 
-A palavra de quem que foi sumariada na própria carta escrita às igrejas?
 
-Quem falou em nome do corpo de apóstolos?
 
-Quem deu o veredicto?
 
-Quem mais discursou?
 
-Quem o autor do livro deu mais ênfase ao discurso?
 
-O julgamento de quem foi o efetivo?
 
Iremos analisar cada um dos pontos apresentados acima. Se o leitor tiver paciência e estiver com a mente aberta à verdade, verá que é necessário um verdadeiro assassinato e sepultamento da lógica para não colocar Tiago no papel de liderança do Concílio da Igreja. Vamos começar pelo primeiro ponto.
 
 
-Quem foi que teve a palavra final?
 
Essa primeira questão é muito importante, pois chega a ser determinante a fim de identificarmos quem exerceu a liderança. Até os dias de hoje é comum a pessoa mais importante discursar por último. A pessoa mais importante é a última a discursar pelas seguintes razões:
 
a) É aquela que dá a palavra final, a decisiva, a irrefutável. A pessoa mais importante é a última a falar para concertar o erro de alguém que discursou antes, ou a fim de confirmar o pensamento de alguém que discursou anteriormente. O mais importante é sempre o último a discursar porque, se alguém de escala inferior der a palavra final e não for a palavra mais correta, ninguém poderia concertar o erro depois.
 
Então, o papel do líder é esperar todos discursarem para, depois de analisar todos os lados, dar o seu veredicto e decidir entre quem está com a razão e quem está errado na questão abordada. Nunca você vai chegar em alguma reunião de negócios, concílio, mesa diretiva, ou qualquer reunião importante e ver alguém de escala menor determinando a palavra final e dando fim à toda uma discussão. É sempre – repito: sempre! – o líder que tem a palavra final, por ser o detentor da autoridade máxima ali dentro.
 
É ele quem corrige ou confirma os discursos anteriores. É ele quem dá a reunião por encerrada e decide a questão por completo e em definitivo. No caso de Atos 15, vemos que Pedro já havia discursado nos versos 7 a 11, mas mesmo assim a questão ainda não havia sido decidida e nem a discussão dada como encerrada. Isso seria muito estranho no caso de Pedro ter sido “papa” ou o “príncipe dos apóstolos”, pois a decisão dele é a que deveria ser a decisiva, a definitiva, a que iria determinar a questão e dar o tema por encerrado.
 
Porém, vemos que depois de Pedro ainda houve debate na assembléia (v.12), e foi somente quando Tiago tomou a palavra que a questão foi decidida. Note que Tiago não discordou da posição de Pedro – ele concordou com ele (vs.13-21). Se fosse Pedro o líder e Tiago fosse seu subordinado, então Pedro não precisaria ter esperado Tiago dar a decisão final, ainda mais sendo a opinião de Tiago tão semelhante à de Pedro!
 
Alguém já viu um chefe dar a sua palavra e mesmo assim a questão ainda ser discutida e precisar de algum outro para determinar o fim da questão? Creio que não, logicamente. Se Tiago tivesse posição hierárquica inferior a Pedro, a discussão teria acabado com Pedro, sem a necessidade do discurso de Tiago, ainda mais levando-se em conta que Tiago concordou com as palavras de Pedro. Note também que, após Tiago ter concluído seu discurso, ninguém mais ousou discordar dele e nem sequer levantar qualquer tipo de oposição!
 
Não foi necessário mais debate, mais contenda ou mais discussão. Tiago falou, tá falado. Tiago disse, questão encerrada. Os católicos bem que gostariam que Pedro tivesse o papel exercido por Tiago neste Concílio, mas não teve. Queriam que Pedro fosse tão decisivo assim, mas não foi. Depois que Pedro falou, a questão ainda teve que passar por Paulo e Barnabé, para depois chegar ao veredicto de Tiago e só então ser encerrada – com a palavra de Tiago, e não de Pedro!
 
 
-A palavra de quem que foi sumariada na própria carta escrita às igrejas?
 
Essa questão também é de fundamental importância, pois, uma vez sendo Pedro o “líder” da Igreja (de acordo com os apologistas católicos), a carta com as recomendações aos irmãos das igrejas sobre a decisão do Concílio deveria estar baseada nas palavras de Pedro, e não na de algum outro.
 
Já imaginou um Concílio mais recente, em que o papa está presente mas é um mero bispo quem é levado em maior consideração e fala tudo aquilo que o papa não falou, decidindo a questão por si mesmo? Inacreditável, não é mesmo? Mas foi bem isso o que aconteceu. Note a semelhança marcante entre o discurso de Tiago e a carta enviada às igrejas:
 
a) O Discurso de Tiago:
 
“Quando terminaram de falar, Tiago tomou a palavra e disse: Irmãos, ouçam-me.
Simão nos expôs como Deus, no princípio, voltou-se para os gentios a fim de reunir dentre as nações um povo para o seu nome. Concordam com isso as palavras dos profetas, conforme está escrito: ‘Depois disso voltarei e reconstruirei a tenda caída de Davi. Reedificarei as suas ruínas, e a restaurarei, para que o restante dos homens busque o Senhor, e todos os gentios sobre os quais tem sido invocado o meu nome, diz o Senhor, que faz estas coisas’ conhecidas desde os tempos antigos’. Portanto, julgo que não devemos pôr dificuldades aos gentios que estão se convertendo a Deus. Pelo contrário, devemos escrever a eles, dizendo-lhes que se abstenham de comida contaminada pelos ídolos, da imoralidade sexual, da carne de animais estrangulados e do sangue. Pois, desde os tempos antigos, Moisés é pregado em todas as cidades, sendo lido nas sinagogas todos os sábados" (Atos 15:13-21)
 
Agora, notem a semelhança com o conteúdo da carta que foi enviada às igrejas com a decisão do Concílio presente em Jerusalém:
 
b) A Carta enviada às Igrejas:
 
“Então os apóstolos e os presbíteros, com toda a igreja, decidiram escolher alguns dentre eles e enviá-los a Antioquia com Paulo e Barnabé. Escolheram Judas, chamado Barsabás, e Silas, dois líderes entre os irmãos. Com eles enviaram a seguinte carta: Os irmãos apóstolos e presbíteros, aos cristãos gentios que estão em Antioquia, na Síria e na Cilícia: Saudações. Soubemos que alguns saíram de nosso meio, sem nossa autorização, e os perturbaram, transtornando suas mentes com o que disseram. Assim, concordamos todos em escolher alguns homens e enviá-los a vocês com nossos amados irmãos Paulo e Barnabé, homens que têm arriscado a vida pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Portanto, estamos enviando Judas e Silas para confirmarem verbalmente o que estamos escrevendo. Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não impor a vocês nada além das seguintes exigências necessárias: Abster-se de comida sacrificada aos ídolos, do sangue, da carne de animais estrangulados e da imoralidade sexual. Vocês farão bem em evitar essas coisas. Que tudo lhes vá bem” (Atos 15:22-29)
 
A semelhança é irrefutável e mostra que a carta enviada às igrejas de Antioquia, da Síria e da Cicília é inteiramente baseada no discurso de Tiago, e não no de Pedro! Aliás, cabe-se notar que o discurso de Pedro nem sequer consta na carta enviada às igrejas!!!
 
Isso seria um completo absurdo caso fosse Pedro o líder máximo da Igreja, pois deveríamos esperar que coubesse a ele o papel proeminente no Concílio, bem como na carta oficial entregue às igrejas sobre as decisões ali tomadas. O discurso de Pedro foi importante, mas não o decisivo, nem o mais importante, nem tampouco o que ficou fixado na carta oficial às igrejas. Leiam o discurso de Pedro:
 
“Depois de muita discussão, Pedro levantou-se e dirigiu-se a eles: Irmãos, vocês sabem que há muito tempo Deus me escolheu dentre vocês para que os gentios ouvissem de meus lábios a mensagem do evangelho e cressem. Deus, que conhece os corações, demonstrou que os aceitou, dando-lhes o Espírito Santo, como antes nos tinha concedido. Ele não fez distinção alguma entre nós e eles, visto que purificou os seus corações pela fé. Então, por que agora vocês estão querendo tentar a Deus, impondo sobre os discípulos um jugo que nem nós nem nossos antepassados conseguimos suportar? De modo nenhum! Cremos que somos salvos pela graça de nosso Senhor Jesus, assim como eles também” (Atos 15:7-11)
 
Note que Pedro incluiu várias coisas em seu discurso. Ele falou sobre:
 
a) Deus tê-lo levantado para pregar aos gentios.
 
b) Deus ter concedido o Espírito Santo aos gentios.
 
c) Deus não fazer distinção entre judeus e gentios.
 
d) Deus purificar os corações de ambos (judeus e gentios) pela fé.
 
e) A salvação pela graça, tanto para judeus quanto para os gentios.
 
Note que houve no mínimo cinco pontos no discurso de Pedro. Em contrapartida, como vemos na carta enviada às igrejas, qual desses pontos levantados por Pedro foram escritos por oficial na carta? Eu respondo: Absolutamente nenhum! Isso pode soar forte para quem já ficou abitolado a crer cegamente que Pedro era o líder, o líder, o líder.
 
Mas como pode “o líder” não ser sequer mencionado na carta enviada às igrejas, e seu discurso completamente ignorado? Isso seria logicamente impossível no caso de Pedro ser papa! Imagine um importante Concílio da Igreja, em que o próprio papa é um dos que discursam, ele fala, fala, fala... mas no final nada do que ele disse é levado em efetivo na carta sobre a decisão do Concílio, mas somente a fala de um outro cara que disse que:
 
a) Os cristãos deveriam se abster da comida sacrificada aos ídolos.
 
b) Se abster também do sangue.
 
c) Da carne de animais estrangulados.
 
d) E da imoralidade sexual.
 
Este foi o conteúdo da carta enviada às igrejas (vs.22-29), curiosamente exatamente as mesmas palavras de Tiago no verso 20! Se Pedro fosse papa, as suas opiniões e o seu discurso seriam muito mais levados em conta do que as de Tiago. O mais lógico de se esperar seria obviamente que o relatado na carta estivesse baseado nas palavras de Pedro, e não nas de algum outro. Que os pontos levantados por Pedro fossem exatamente os que foram levantados na carta.
 
Mas os apóstolos, em comum acordo, decidiram não escrever na carta NENHUMA palavra dita por Pedro e ainda por cima colocarem exatamente as mesmas palavras proferidas por Tiago. Se depois disso tudo os católicos ainda conseguem imaginar que Pedro era o papa infalível, a autoridade máxima, o “príncipe dos apóstolos”, o detentor do primado, da primazia jurisdicional, da liderança na Igreja... só cabe lamentar, pois então não há nada que possa convencê-los do contrário, sendo a Bíblia tão clara e evidente!
 
 
-Quem falou em nome do corpo de apóstolos?
 
Essa questão está diretamente relacionada à anterior, mas com a ênfase de que o corpo apostólico não apenas aceitou a palavra de Tiago, como também tomou para si as suas palavras, baseando-se em seu discurso e não admitindo posições contrárias a isso. Dito em termos simples, Tiago, ao discursar, discursou em nome de todo o corpo apostólico.
 
Quando Barack Obama discursa sobre uma hipotética entrada dos Estados Unidos em alguma guerra, ele não está discursando apenas sobre si mesmo ou sobre a sua própria opinião sobre o caso, mas está discursando em nome de todos os Estados Unidos da América. São os Estados Unidos quem estão entrando na guerra, e não Obama. Por mais que o discurso tenha sido dele, não será ele quem lutará sozinho, mas todo o exército norte-americano.
 
A mesma coisa acontece no Concílio de Jerusalém. Quando Tiago discursou, ele não estava apenas mostrando tão-somente uma opinião particular sua, mas tomando a decisão final em nome de todo o corpo apostólico, que adotou com unanimidade o seu veredicto (v.22, 28).
 
Se Tiago estivesse somente relatando uma opinião particular – como fez Pedro – poderíamos não levar isso tão em consideração. Mas quando vemos que as palavras de Tiago foram adotadas como as palavras do Concílio, isto é, como a palavra do corpo apostólico, vemos que Tiago teve o poder decidido de falar por todo o corpo de apóstolos, o que cremos que não seria possível se ele não passasse de uma “sombra” de Pedro!
 
 
-Quem mais discursou?
 
Por mais que esta questão por si só não seja um argumento definitivo, ela também é importante, pois na maioria das vezes o chefe ou líder comanda a reunião e tem o maior tempo de fala (e não somente o discurso mais importante e o veredicto final, como já demonstramos aqui). No caso de Pedro, foram somente cinco versículos, do verso 7 até o verso 11. Já com Tiago, foram nove versículos, do verso 13 até o verso 21, além do fato de que a carta foi praticamente que uma repetição do seu discurso.
 
Como já disse, o fato de discursar mais não significa necessariamente que a pessoa é a mais importante da mesa, mas na maioria das vezes é isso o que acontece, e, para variar um pouco, novamente Pedro fica atrás de Tiago nisso também! Na verdade, em todos os quesitos que respaldam o papel de um líder, Pedro fica desaparecido e Tiago toma a proeminência. Pedro só foi começar a falar “depois de muita discussão” (At.15:7).
 
A sua fala, ainda que importante, não foi decisiva. Precisou de Paulo e de Barnabé discursarem depois, com toda a assembléia em silêncio absoluto diante deles (At.15:12), e fechou com a posição definitiva e o veredicto de Tiago. Nenhuma das posições levantadas por Pedro foram adotadas nas prescrições da carta enviada às igrejas e ele não foi o que mais discursou. Não teve nenhum papel que pudesse pela lógica e coerência identificá-lo como o líder. Pelo contrário! O presente caso só é mais uma demonstração de como que Roma realmente consegue “transformar o branco em preto” na mente do clero católico!
 
 
-Quem o autor do livro deu mais ênfase ao discurso?
 
O autor do livro de Atos dos Apóstolos foi Lucas, o médico e escritor do evangelho de Lucas, como historicamente se aceita em todas as comunidades cristãs. Em todos os pontos anteriores explanamos o Concílio em si, mas não sobre a ênfase que o autor de livro dá, o que também é de crucial importância. Afinal, se Pedro fosse papa, Lucas saberia muito bem disso e daria uma maior ênfase a ele e ao seu discurso.
 
Entretanto, além de em momento nenhum ter escrito qualquer coisa sobre uma suposta “liderança de Pedro”, ele foca-se praticamente inteiramente no papel exercido por Tiago e sempre faz questão de respaldar que a decisão foi aprovada “pelos apóstolos e presbíteros” (At.16:4), e não por Pedro. Evidentemente, Pedro faz parte deste grupo de “apóstolos e presbíteros”, mas note que Lucas não faz qualquer questão de ressaltar Pedro em aspecto particular, ou como exercendo um papel mais fundamental que os outros.
 
Ao invés de dizer que “o papa fulano escreveu isso”, ele simplesmente escrevia que a decisão passou pelo consentimento de todo o corpo apostólico sumariado no discurso de Tiago. Não tem qualquer visão mais particular em Pedro, nenhuma menção de sua suposta “infalibilidade” (que seria imprescindível em um Concílio tão importante e impossível de ser passada “despercebida”!), nenhuma ênfase na pessoa de Pedro ou em seus vários “atributos de papa”, que a Igreja Católica Romana atribuiu a ele muitos séculos depois (sem ele ficar sabendo disso).
 
Além disso, desde quando Paulo entra em cena no livro de Atos (no capítulo 15), Pedro desaparece completamente de cena e nem sequer é mencionado até o final do livro! Isso seria um completo absurdo e um disparate sem precedentes no caso de Pedro ter sido o papa da Igreja Primitiva, mas é isso o que temos que aceitar diante do quadro evidente presente no livro de Atos, que pelo seu conteúdo pode ser dividido em três partes:
 
Capítulo 1 ao 12
Capítulo 13 ao 15
Capítulo 16 ao 28
Atos dos Apóstolos
Atos de Paulo e Barnabé
Atos do apóstolo Paulo
 
Aceitar que Pedro era o papa significa dizer que Lucas, o maior historiador da história da Igreja Cristã Primitiva e que conviveu com os apóstolos, preferiu dirigir as suas atenções completamente a alguém “inferior”, deixando o papa de lado, abandonado na galeria do esquecimento, sem sequer fazer citação dele durante 13 capítulos, até o fim do livro!
 
Como podemos aceitar que as pessoas menos importantes pudessem ser muito mais evidenciadas do que a que deveria exercer exatamente este papel? Como podemos admitir que o “papa” tivesse sido ignorado completamente desde o término do capítulo 15, até o final do livro? Ao que todas as evidências nos demonstram, fica óbvio que Pedro, embora fosse importante na Igreja, está muito longe de exercer toda a primazia que a Igreja Católica mistificou em cima dele.
 
A figura quase mitológica de Pedro tomou o lugar da figura real do Pedro bíblico, que não liderava Concílios e que muitas vezes era colocado em segundo plano ou praticamente ignorado. Mas isso não é nada a mais senão aquilo que deveríamos esperar da “obediência passiva” dos servos de Roma, em um sinal próprio da sujeição completa e subserviente ao papa.
 
 
-O julgamento de quem foi o efetivo?
 
Já vimos detalhadamente como que foi Tiago quem exerceu o papel de liderança no Concílio de Jerusalém (Atos 15), mas agora cabe também fazermos uma exegese acima do seu discurso, especialmente em cima daquilo que foi dito no verso em que ele próprio se define como o juiz que define o Concílio. Ele diz no verso 19:
 
“Portanto, julgo que não devemos pôr dificuldades aos gentios que estão se convertendo a Deus” (Atos 15:19)
 
Este “julgo” não está ali no sentido de “acho que”, mas sim no sentido de exercer juízo [veredicto] sobre um determinado tema. De acordo com o grego, significa determinar, resolver, decretar algo. O maior léxico que temos a nossa disposição, a respeitadíssima Concordância nominal de Strong, traduz a palavra “krino” (traduzida por “julgo”, no verso acima), entre outros significados, como sendo “parte daqueles que atuam como juízes ou árbitros em assuntos da vida comum, ou emitem julgamento sobre as obras e palavras de outros” (Concordância de Strong, 2919).
 
Com essa palavra, Tiago está tomando para si mesmo a posição de árbitro ou juiz daquele Concílio. Prova disso é que depois ninguém ousa discutir sobre a posição levantada por ele. Se Tiago estivesse somente dizendo “eu acho isso”, a sua opinião não teria maior valor que a dos outros e a discussão não iria se dar por terminada.
 
Mas a palavra no grego tem uma raiz profunda; ela nos mostra que Tiago exerceu o papel de juiz, de árbitro, decidindo a questão em definitivo. A mesma palavra também tem, de acordo com o mesmo léxico, o sentido de “reinar, governar” (novamente ressaltando-se o papel da liderança), e também de “presidir com o poder de emitir decisões judiciais, porque julgar era a prerrogativa dos
reis e governadores”.
 
Essa mesma palavra (krino) era utilizada para o papel dos reis e governadores nas tomadas de decisões judiciais, e ela foi aplicada a Tiago no contexto de Atos 15:19! Ela significa, ainda de acordo com o léxico de Strong, “determinar, resolver, decretar”. Tiago não deu somente uma “opinião” ao Concílio; ele de fato determinou a questão, resolveu o problema, decretou o que deveria ser feito!
 
Ora, decretar significa ordenar algo que não pode ser revogado. A única pessoa que tem poder para fazer isso seria uma autoridade ali presente. O papel para tal coube a Tiago, e não a Pedro de realizar tal serviço. Tendo em vista essas definições conclusivas sobre o papel de Tiago à luz da exegese e do significado de seu discurso, fica claro que sua posição não foi somente a de acrescentar mais uma ideia às demais, mas aquela que decretou e determinou toda a questão.
 
Tiago tomou a palavra, decretou a questão e encerraram-se as discussões. Ele atuou como um árbitro ou juiz para decidir o assunto, como a palavra no grego nos mostra. Diante de tudo isso, querer continuar alegando a tese infundamentada de que era Pedro o líder, ainda mais diante de tantos argumentos irrefutáveis, é no mínimo querer permanecer cego às luz de todas as evidências, sustentando-se somente nos discursos alienadores vindos de Roma.
 
 
-Conclusão e Considerações Finais
 
O resumo de tudo o que foi dito é que uma exegese aprofundada em cima de Atos 15 nos mostra que todos os critérios válidos para determinar quem exerce um papel proeminente em uma discussão cabem perfeitamente dentro da pessoa de Tiago em todo o contexto, mas absolutamente nenhum deles se aplica também a Pedro.
 
Tiago foi o que mais discursou, foi quem deu o veredicto, a palavra final, quem determinou a questão e decretou o assunto, quem teve suas palavras admitidas e aceitas como parte integrante da carta enviada às igrejas, quem falou em nome de todo o corpo apostólico, quem foi alvo da maior ênfase pelo narrador da cerimônia. Não há dúvidas de que Pedro também teve o seu papel no Concílio, mas que não chegou nem perto da importância daquilo que foi o discurso de Tiago.
 
Em nenhum momento há qualquer sinal de liderança para Pedro naquele Concílio, mas há abundantes evidências com relação a Tiago. As alegações romanistas não têm por base a lógica ou o bom senso, mas somente as afirmações forçadas e empurradas pelo clero, que obriga os seus fieis a acatarem em silêncio e submissão total às suas ordens, ainda que sejam absurdas, que dêem um golpe mortal na exegese, que assassinem a hermenêutica e deixem o bom senso na fila do hospital.
 
Diante do presente estudo, os católicos são obrigados a aceitar – se estiverem realmente dispostos a abraçarem a verdade – que Pedro não liderou Concílio nenhum; ao contrário, foi submisso ao papel de líder exercido por outro. Se Pedro fosse o papa, o príncipe dos apóstolos, o infalível, o chefe do grupo apostólico, o que exercia a primazia, ou tantos outros títulos atribuídos pela Igreja Católica ao longo dos séculos, seria obviamente ele quem exerceria a sua primazia absoluta naquele lugar, que tomaria as decisões, que escreveria a carta, que daria a palavra final, que decretaria o assunto fazendo uso da sua suposta infalibilidade.
 
Pedro, porém, foi sombra de Tiago no Concílio. Tiago estava longe de ser um “papa”, mas tinha autoridade suficiente para deixar Pedro em segundo plano em um debate. De fato, a Igreja não é formada por uma coluna que se sobressai às outras e que se chama de “papa” ou “príncipe dos apóstolos”, mas sim por várias colunas, como Paulo escreve em Gálatas 2:9, mencionando Tiago, Pedro e João, colocando Tiago em primeiro lugar. Nada de Pedro ou algum outro sendo uma coluna única acima dos demais!
 
Mas, acima de tudo, temos Cristo Jesus como o nosso único fundamento. Porque ninguém pode colocar outro alicerce além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo” (1Co.3:11). E é esse alicerce que tantas vezes é tão esquecido pelos apologistas católicos, que preferem se sujeitar à obediência passiva a um mero mortal na terra – o papa – do que a estarem dispostos a seguirem e andarem na Verdade que liberta: Jesus Cristo, nosso único Caminho (Jo.14:6), nosso único Mediador (1Tm.2:5).
 
Ao contrário daquilo que disse o monge do Mosteiro de São Bento, nós não temos que nos submeter às determinações de alguma Igreja Institucional, se ela estiver errada ou contradizendo as Escrituras. A nossa única submissão incondicional deve ser a Cristo Jesus, para quem vivemos e por meio de quem existimos.
 
Se isto é branco e alguma Igreja diz que é preto, essa Igreja está errada. Se alguma Igreja diz que Pedro era o líder e a lógica diz o contrário, não temos que renunciar à lógica. Diante dos argumentos apresentados, a insistência do monge, assim como a de milhões de outros católicos espalhados ao redor do mundo, dispostos a renunciarem à Verdade para se submeterem à Instituição, não é senão o símbolo de sua escravidão ao papa.
 
 
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Por: Lucas Banzoli.
 
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