MINHA TERCEIRA PARTE
Olá, Marcus.
Entendo perfeitamente o seu posicionamento sobre não querer debater sobre os argumentos para a existência de Deus, embora seja algo que, em minha opinião, segue-se irremediavelmente em qualquer debate sobre agnosticismo. De qualquer modo, vou me manter apenas dentro daquilo que foi exposto por você em sua última argumentação.
Você alegou que “há uma diferença específica, que é o ônus da prova”. Porém, nem ateus nem teístas estão isentos do ônus da prova; de fato, ninguém pode se esconder e lançar o ônus da prova para os outros. O ônus da prova consiste em que a pessoa responsável por determinada proposição é também aquela que deve oferecer as provas necessárias para sustentá-la.
Por exemplo, se você se diz ateu, você tem que mostrar provas para a sua posição de que Deus não existe. Se, contudo, você for teísta, você deve fornecer evidências que possam provar a existência de Deus. Ninguém está isento do ônus da prova, e dizer somente que “não há bons motivos para crer na existência de Deus” não é um argumento contra a existência de Deus, visto que podem existir até mesmo teístas que creem puramente pela fé, mesmo pensando que não há evidências além dela para a sua existência!
Portanto, creio que o quadro que você expos, ainda que seja mais qualificável que o de Dawkins, ainda falha em admitir que alguém pode sustentar uma proposição se livrando do ônus da prova, assim como falha também em presumir que toda pessoa que acha que não existem bons motivos para acreditar em Deus seja necessariamente “ateísta”, quando na verdade existem cristãos verdadeiros que creem nesta afirmação (eu não me enquadro entre eles, é claro) mas não são ateístas, e nem por isso deixam de ser cristãos.
Portanto, apenas achar que não existem boas evidências de existência de Deus não faz uma pessoa ser necessariamente ateísta e muito menos prova que Deus não existe, visto que um ateu deve fornecer provas contra a existência de Deus que vão além da mera e simples negação de seus argumentos.
Ademais, vale ressaltar também que se alguém defende a existência de um Deus sem especificações (teísmo indefinido) ele também está sujeito ao ônus da prova, tanto quanto aqueles que pregam o teísmo definido!
É claro que as peculiaridades variam de um para outro (um cristão teria que provar a existência e ressurreição de Cristo, um espírita teria que provar a existência da reencarnação e os mulçumanos terão que provar que Maomé é o “último profeta”), mas em todos os casos ninguém está isento do ônus da prova, nem mesmo aquele que afirma um teísmo indefinido, pois este também teria que mostrar evidência da existência da “ideia de Deus”, seja por meio de argumentos cosmológicos ou ontológicos.
De qualquer forma, independente da maneira que será utilizada para tentar justificar a veracidade do teísmo que está sendo proposto, ele não poderá simplesmente fazer uma afirmação vazia sem argumentar ou no mínimo oferecer provas em favor dela! Tendo em vista isso, creio não ser válida tal diferenciação acerca do ônus da prova para quem alega um teísmo definido em detrimento dos que alegam um teísmo indefinido, pois tanto um quanto o outro tem a obrigação de respaldar os seus pontos de vistas com argumentos de suporte.
Além disso, alguém pode ser “ateu negativo” (de acordo com o quadro que você passou) sem necessariamente estar se referindo a uma “divindade específica”, como você disse. Alguém pode achar que “não há boas evidências para a existência de Deus” se tratando não de uma divindade específica, mas somente à “ideia de Deus”, sem especificações. Não é necessário de modo algum estar se tratando de uma divindade específica para dizer que não há boas evidências da existência de Deus!
Por fim, você afirmou que os agnósticos só estão em “incerteza TOTAL”:
“Há certezas radicais em ambos os extremos, e uma mistura de certezas e incertezas nas posições mais próximas do centro, mas no centro em si, o Agnosticismo, só há Incerteza, total!”
Eu faço questão de sublinhar a expressão usada por você mesmo em seu artigo – “TOTAL” -, ou seja, em relação a TODOS os sistemas abordados anteriormente, dentro os quais inclui-se evidentemente o teísmo definido. Sendo assim, você não poderia afirmar que é “ateu” com relação ao Deus Cristão e não ao Kardecista, nem tampouco que é totalmente descrente no demônio, pois, como você mesmo disse, deveria estar em “INCERTEZA TOTAL”!
Você se contradiz logo em seguida quando se mostra agnóstico com relação ao Deus Kardecista ou a “ideia de Deus”, mas ateu com relação ao Deus Cristão ou a outra divindade em específico (mostrando que não há TOTAL incerteza em todos os âmbitos, mas somente em relação ao “teísmo indefinido”), algo que você disse em sua última resposta para levantar objeções aos meus argumentos que, na realidade, só lhe fizeram entrar em uma OUTRA contradição, desta vez em relação àquilo que você havia dito anteriormente em seu artigo original.
Quanto aos seus argumentos contra a existência de um Deus específico (como o Deus Cristão em contraste com o Deus Kardecista), eu creio que eles falham principalmente em presumir que, por causa que algo está sujeito a refutações, então consequentemente ele já está refutado. Esta é uma falácia, pois, ainda que de fato se provassem a inexistência de Cristo o Deus Cristão seria declaradamente falso, isso não significa que ele é falso enquanto não se provarem factualmente que Jesus jamais existiu!
O simples fato de algo estar sujeito a ser falseável não significa que realmente não existe, pois a própria teoria da evolução (que você crê fortemente) é falseável e nem por isso você deixa de crer nela! Além disso, o Deus Kardecista não entra “fora” do quadro que foi por você exposto, pois se a crença fundamental do kardecismo (a reencarnação) for falsa, então consequentemente o Deus Kardecista é falso. De fato, a importância da reencarnação no espiritismo é tanto quanto a importância da existência histórica de Jesus para os cristãos!
Deste modo, creio ser inválido tentar excluir o Deus Kardecista deste quadro quando, na realidade, ele é tão sujeito a “falseabilidade” quanto o Deus dos cristãos. Finalmente, existem sólidas provas históricas da existência de Cristo atestada inclusive por escritos não-cristãos do primeiro século AD, e, portanto, seria preciso primeiramente refutar tais evidências históricas para, depois, conjecturar algo em cima disso.
Eu particularmente não vejo nenhum problema em que o mesmo Deus que criou o Universo a partir do nada (i.e, sem tempo, sem matéria) e que criou seres humanos com uma Lei Moral em vigência na humanidade, pudesse da mesma maneira expressar a mesma personalidade em se revelar através da pessoa de Jesus Cristo, ou aos hebreus por meio do nome de “Jeová”.
A não ser que existam bons argumentos para refutar a ideia de que Deus pudesse expressar personalidade e moralidade, não há razões para pensar que ele criou todo o universo e todos os seres humanos para depois abandoná-los “ao acaso”, sem interferir em mais absolutamente nada da Terra, como creem os deístas.
De fato, penso que se seguirmos uma lógica coerente, podemos presumir que o mesmo Deus (sem especificações) que interviu no acontecimento do surgimento do universo e da criação humana, criando inclusive vida a partir da não-vida, pode também continuar intervindo e interagindo com a Sua Criação, assim como fez no princípio. Negar isso seria negar a própria existência de Deus (sem especificações), ou limitando-o a não poder novamente exercer o seu poder de influência sobre os acontecimentos físicos e materiais que regem o nosso Universo.
Seu eu criasse do nada as folhas e capa que compõe um livro, nada me impede de continuar o meu “trabalho” escrevendo nas páginas deste livro. Da mesma forma, se Deus criou a matéria que deu início ao Universo e coordenou todas as coisas de forma a dar animação (vida) à sua criação, nada lhe impede de continuar escrevendo a história deste livro chamado vida.
Um grande abraço, caro Marcus, e até a próxima.
Lucas Banzoli.