DEBATE COM MARCUS VALÉRIO

PRIMEIRA PARTE DO MARCUS

 

Caro Lucas...

 

É um prazer finalmente entrar em contato com você, seja bem vindo ao meu site. Como deve saber, há muito alguns visitantes tem comentado sobre seu Site de Teologia, o qual andei examinando e no geral acho bastante interessante. Ainda que discorde quase todo o seu conteúdo, principalmente devido a questões de fundamentação, penso que é bastante equilibrado em suas posições. Fico até surpreso pela sua tão tenra idade! Em meu outro site há algumas mensagens a seu respeito.

 

Bem, quando às questões que levantaste, acho que resultam de uma confusão que poderia ter sido facilmente evitada simplesmente com uma leitura mais atenta de EM DEFESA DO AGNOSTICISMO. Em especial, devido a trechos como os seguintes:

 

"...estamos lamentavelmente condicionados a travar o debate sobre a existência de Deus sempre tendo em vista o Deus Monoteísta de tradição Abraâmica, ou no nosso caso particular, exclusivamente o Deus Trinitário Cristão."

(...)

O problema então continua sendo a simples incapacidade de distinguir a idéia de Deus de uma divindade específica qualquer."

 

Pronto. Isso deveria ser mais que suficiente para responder suas dúvidas, pois quando falei das razões de ser impossível provar ou reprovar a existência de Deus, claramente estava me referindo à idéia de Deus com "D" maiúsculo. Algo mais para um Teísmo Indefinido. O que definitivamente não é o caso do Deus Bíblico é muitíssimo menos do Diabo bíblico.

 

Se você acha que aquele Jeová que caminhava no Éden, apareceu na forma de um arbusto flamejante no Monte Sinai, ou inseminou uma virgem para ter um filho, é um ser realmente transcendental e imaterial, só posso lamentar, porque na Bíblia sequer há a distinção entre espiritual e material, sendo o espírito nada mais de que uma entidade gasosa, os anjos são seres nitidamente físicos e o próprio céu está literalmente estendido sobre a Terra.

 

Foi o trabalha árduo e criativo de teólogos muitíssimo posteriores que, conseguindo fundir o idealismo platônico com o cristianismo, criaram essa mistura absurda de um deus tribal que seria algo próximo do Deus ideal filosófico, dando saltos lógicos fantásticos que passavam de um grupo de conceitos abstratos para uma pessoa divina que tem até nome próprio. E mesmo isso foi totalmente jogado fora pelo fundamentalismo cristão início do século XX, especialmente ao tornar literal, e completamente absurda, a leitura da bíblia.

 

Além do mais, não consigo acreditar que você pense, mesmo dentro do seu sistema de crenças, que o Diabo tenha as mesmas propriedades de Deus! Como poderia! Acaso o Diabo seria Onipotente? Onipresente? Eterno? Ser Necessário? Como podes equivaler uma criatura, ainda por cima corrompida, com o seu criador perfeito e atemporal?!

 

E quanto ao Deus Kardecista, sou agnóstico porque ele corresponde à idéia mais abstrata e genérica de um Deus, muitíssimo diferente do Deus Bíblico por uma série de motivos: Não tem nome. Não intervém diretamente na história humana, não ditou livros por meio do Espírito Santo, não fica mudando de idéia e se arrependendo do que construiu, nunca encarnou na terra, não perde seu tempo com apostas ridículas com o diabo para testar a fé alheia, etc!

 

Completamente diferente.

 

Por fim, você certamente deve saber, todos os argumentos filosóficos para a existência de Deus são facilmente refutáveis. Então chega a soar descabido que venha a mim, que lido com essas questões há mais tempo do que você está vivo, colocando-os como se fossem provas! Não tem nem sentido em perder meu tempo aqui expondo os contra argumentos que podem ser facilmente achados em qualquer lugar. Muito menos perder meu tempo com tolices como Paradoxo da Pedra, que já comentei diversas vezes, incluindo na Mensagem 696

 

Devo acrescentar somente que todos os argumentos lógicos para a existência de Deus sofrem de um problema chamado Idealismo, que pressupõe a linguagem como mero veículo de conceitos perenes que podem ser traduzidos em termos precisos. Mas após um século de Filosofia Analítica não se pode ignorar ao menos a possibilidade de que todos sejam meramente redutíveis a jogos de linguagem, erros conceituais que confundem o símbolo linguístico com um suposto objeto que pode muito bem sequer existir.

 

O fato de haver uma representação conceitual não torna tão conceito automaticamente verdadeiro.

 

Portanto, em resumo.

 

1 - Sou agnóstico em relação à idéia de Deus pelos motivos que você mesmo reproduziu.

 

2 - Esse motivos, porém, NÃO SE APLICAM ao Deus mitológico bíblico e muitíssimo menos ao seu rival, o Diabo.

 

3 - Argumentos em favor da existência de Deus jamais foram provas. São apenas raciocínios razoavelmente coerentes baseados em premissas discutíveis que frequentemente podem ser confrontados tanto nas premissas quanto nas conclusões.

 

4 - O Deus Kardecista é radicalmente diferente do Deus Bíblico, a não ser que admite um grau de simbolismo e alegoria na bíblia muitíssimo além do que os cristãos, até mesmo os católicos mais sofisticados, estão dispostas a admitir.

 

Espero ter respondido.

 

Amigavelmente,

Marcus Valério XR